O projeto Casa Rodante, desenvolvido pelo coletivo artístico casadalapa em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo, é uma iniciativa artística e social que tem como cenário a região da Luz, no centro da cidade de São Paulo.
Atuando em frentes diversas, o projeto mescla aspectos do urbanismo tático nômade com meios de expressão artísticos e algumas ideias caras à psicologia social e para envolver e fazer interagir os diferentes moradores da região, de trabalhadores do comércio a crianças e dependentes químicos.
Saiba mais sobre o projeto Casa Rodante a seguir:
A região da Luz foi o primeiro bairro planejado da cidade de São Paulo. Através de um loteamento voltado para os Barões do Café, dois engenheiros Nothman e Glete, um alemão e outro suíço, visavam criar um bairro nobre para os agricultores do café que, através da recém inaugurada estrada de ferro Sorocabana, poderiam morar na então urbanidade paulistana e acompanhar seus negócios no interior.
Este glamour começou a ruir com a queda da bolsa de valores de Nova York em 1929, no qual o excesso de produção cafeeira no Brasil levou à bancarrota muitos destes Barões. Foi o começo de uma nova ocupação de moradia na região, com o abandono de enormes casarões de famílias ricas da época, estes imóveis transformaram-se em sua maioria em hospedarias e pequenos hotéis ocupados de forma não planejada.
Neste período um destes casarões abrigou o Palácio Campos Elísios, sede do Governo do Estado, que, por atrair uma enorme demanda de serviços, ainda manteve um certo ar nobre na região. No entanto, a sede do governo paulista muda-se em 1965 para o Palácio dos Bandeirantes no Morumbi, removendo da região da Luz seu principal atrator.
Outro fato marcante para o bairro foi a controversa inauguração em 1960 da Rodoviária de São Paulo ou Terminal Rodoviário da Luz. Sendo o primeiro terminal rodoviário interestadual da cidade - um empreendimento privado com concessão pública - este não contou com um planejamento adequado e gerou caos no transito da região. Este terminal funcionou até a década de 80, quando foi inaugurado o Terminal Rodoviário do Tietê.
A rodoviária deu lugar a um centro comercial popular que funcionou até 2007, quando o governo do estado desapropriou o edifício para a futura construção de um centro cultural para a dança, que ainda não saiu do papel. Esta foi uma das medidas levadas a cabo pelo projeto Nova Luz, que através da formação de equipamentos culturais e parcerias público-privadas, garantiria a revitalização da região.
Um bairro popular do centro de São Paulo, com contrastes de comunidades distintas entre nordestinos, paraguaios, peruanos, africanos etc., o bairro lembra muito uma cidade do interior com muita gente na rua, devido à falta de quintal nos enormes casarões herdados de um passado próximo e o habito destas comunidades de conviver no espaço público: a calçada como quintal.
Um bairro com uma extensa rede de infraestrutura publica de transporte e serviços, localizado próximo ao centro e a outras áreas importantes da cidade, logo atraiu a atenção do mercado imobiliário.
Neste território o coletivo casadalpa, em parceira com a Secretaria de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo,criou o projeto casa rodante, que através de uma casa de atmosfera lúdica construída sobre uma caminhonete, funciona como catalisador de convívio com os habitantes do bairro. Uma casa que abriga bancos e mesas, equipamento de som e cinema, material pedagógico educativo para as crianças e uma biblioteca livre.
As várias calçadas do bairro se tornam nossa sala de estar, onde sempre tem agua, café do seu Cris e livros, conversa e ações diretas de intervenções artísticas, como por exemplo, através de:
- Pinturas e colagem de painéis;
- coleta de estórias pessoais que são transformadas em micro roteiros colados nos postes pela artista Laura Guimarães;
- Construção e manutenção de mobiliário público em conjunto com a população;
- Desenvolvimento de agricultura urbana, um processo este acompanhado pelo agricultor biodinâmico Marcos Castanho;
- Um estúdio de fotografia a céu aberto com o nosso “Fotografo de Bairro”. Trabalho desenvolvido em conjunto com o fotografo Zeca Caldeira, onde os moradores e habitantes do bairro fotografados, tendo uma cópia da foto ampliada e entregue para eles. Outra cópia vira ampliação em grande formato para "empapelar" ocupações ou prédios que sofrem ações de despejo com a nossa campanha “Respeito Pessoas Morando”;
- Ações de literatura de muro com o coletivo Transverso e os Palestinos;
- Musica Popular com o nosso palhaço punk socialista Cleroauk.
É muito comum se reunirem na mesma mesa de reunião moradores, crianças, agentes públicos e dependentes químicos, todos em convívio.
Entre outras ações de convívio e vizinhança, a iniciativa que entende que o bairro não sofre apenas com a situação de consumo de drogas a céu aberto, mas com um longo abandono público da região, principalmente com a população mais desassistida e fragilizada. O incentivo do convívio no espaço público através de intervenções artísticas ajuda a formar um sentido de pertencimento comunitário e uma conscientização para permanecer na região, exigindo melhorias públicas para todos.
A casa rodante é formada por doze profissionais, entre artistas e psicólogos, que contam com o apoio de uma grande rede de aliados. Esta é uma nova experiência no atendimento público de redução de danos com os dependentes químicos, onde a arte urbana e a psicologia dialogam em um território público visando reconquistar a confiança dos moradores e ganhar fôlego para a luta diária que é viver num grande centro como o de São Paulo, onde o sentido de humanidade pode facilmente se perder na escala da metrópole.